Por "psique" entendemos "o conjunto de todos os processos psíquicos, tanto conscientes como inconscientes" (CW vol. 6, página 463). A psique, portanto, é constituída por imagens refletidas e processadas no cérebro. Imagens, sons, emoções, sensações do mundo objetivo são processadas no cérebro de forma claramente demonstrada pela neurociência moderna. Através da ressonância magnética os pesquisadores são capazes de detectar e registrar os movimentos mais "refinados" da energia que ocorre em todo o cérebro. Em nosso mundo moderno a psicanálise e a neurociência caminham de mãos dadas, contribuindo entre si e reciprocamente para as recentes aquisições do conhecimento.
Mas a verdadeira natureza da psique ainda está muito além da compreensão objetiva, mecanicista e reducionista da neurologia, da psicopatologia, psiquiatria e das neurociências em geral. Jung defende a idéia de que as imagens e objetos assumem o caráter de consciência apenas quando têm alguma associação ao ego, caso não se associem ao ego esse material permanece em nível inconsciente. A perda de memória é um exemplo típico deste fenômenos psicológico.
A Consciência

A consciência é um fenômeno diretamente relacionado ao Ego. Para Jung, existem quatro funções da consciência; a sensação e razãoimaginação e entendimento. Ele faz ainda uma comparação do fluxo da consciência com um feixe de luz de uma tocha; tudo o que pertence ao feixe de luz visível se torna consciente, aquilo que está fora do feixe de luz, apesar de tenuamente iluminado, é inconsciente. Assim, tudo o que é visto, ouvido, sentido subliminarmente é armazenado no inconsciente, sem mesmo percebermos.

É importante notar, porém, que as imagens de experiências vividas, apesar de inconscientes, não deixam de existir. O fato de não percebermos claramente esses elementos não significa que eles não estejam lá, eles simplesmente não estão à disposição da consciência.
O material vivencial apreendido pela pessoa pode ter representações que variam desde simples lembranças agradáveis da infância, com intensa e gostosa luminosidade resistente ao tempo, até terríveis experiências traumáticas envolvendo todo tipo de abusos psicológicos e físicos dolorosos terrivelmente fixados em nossas memórias. Essas vivências podem se tornar o que Jung chamou de "complexos psicológicos autônomos".
Normalmente, as experiências traumáticas, pelo fato de serem perturbadoras e desagradáveis, são reprimidas, tanto consciente como inconscientemente, pelos chamados "mecanismos psíquicos de autodefesa". Esses mecanismos, com funções psicológicamente lenitivas, acomodam as experiências emocionalmente dolorosas na profundidade do inconsciente.
Algumas vivências reprimidas jamais voltarão a emergir para a superfície de nossa consciência, portanto, serão praticamente esquecidas na profundidade de nosso mundo mental. Entretanto, é comum essas experiência emocionais se rfevestirem de alguma energia afetiva e, dependendo do nível de energia agregada a esses complexos psíquicos, alguns deles se farão presentes na consciência indefinidamente, independentemente de nossa vontade, de nosso consentimento ou nosso controle consciente.
Dependendo da intensidade das experiências vividas e da quantidade de libido (energia) associada a elas, poderão permanecer ativas por longo período de tempo, às vezes por décadas, às vezes para sempre. Os complexos psíquicos fortemente carregados de energia (libido), mesmo estando reclusos na profundidade do inconsciente, poderão se manifestar sutilmente e indiretamente através de nossas atitudes, de nosso humor, de nossa fala, audição, de visões, sonhos, fantasias, enfim, esses complexos psíquicos poderão “contaminar” toda atitude existencial.
A influência que o material psíquico reprimido exerce na vida da pessoa é, além de inegável, variada de acordo com sua carga energética (libidinal). Os casos de repressões com intensidade libidinal muito forte podem estar relacionados a patologias mentais francas, assim como, inversamente, podem se relacionar apenas a certos desconfortos emocionais, muitas vezes considerados "normais", os complexos psíquicos impregnados por energia mais tênue e fraca.
Jung relacionava os atos falhos, como por exemplo, os pequenos lapsos inexplicáveis de memória, como acontece quando uma pessoa substitui o nome de um amigo por outro, de uma namorada por outra, quando um objeto é exaustivamente procurado apesar de estar bastante visível ou mesmo quando se diz algo chocante, como um deslize da língua ou do vocabulário, sem sentido aparente.
Há numerosos exemplos destas ocorrências cotidianas embaraçantes que nada mais são do que reflexos dos complexos psíquicos presentes na vida de todos nós. Freud chamou alguns destes fenômenos de parapraxis, os quais surgem quando os complexos autônomos do inconsciente explodem em eloqüente disseminação energia na consciência, geralmente através de algum impulso.
Esse fenômeno acontece freqüentemente em escala de grande potência nas crises neuróticas agudas, na exuberante sintomatologia da esquizofrenia, nas manifestações histéricas e estados afins. Jung dizia que a neurose surgia quando “a consciência era inundada por material inconsciente”.
Jung argumenta ainda que o inconsciente deve ser considerado "um órgão natural, com sua energia específica própria e criativa". Ele define o conteúdo do inconsciente da seguinte forma:
- Tudo aquilo que eu sei, mas que não estou pensando no momento.
- Tudo que já me foi uma vez consciente, mas agora está esquecido.
- Tudo o que foi percebido pelos meus sentidos, mas não notado pela minha mente consciente.
- Tudo que involuntariamente sentido, pensado, lembrado e feito sem que tenha prestado atenção.
- Todas as coisas futuras que vão tomando forma em mim e chegarão, em algum tempo, à consciência.
Isso compõe o conteúdos do inconsciente, além de toda repressão mais ou menos intencional de pensamentos e sentimentos dolorosos. Jung atribuiu ao inconsciente também uma função compensatória à consciência. Daí a existência dos sonhos, devaneios e fantasias que a humanidade experimenta desde tempos imemoriáveis.
"Por muitos anos tenho cuidadosamente analisados cerca de 2.000 sonhos por ano, assim eu ter adquirido uma certa experiência neste assunto", escreveu Jung em 1954, quando tinha setenta e nove anos. O conhecimento profundo da alquimia, da mitologia grega, das culturas indígenas, da filosofia clássica e oriental, da psiquiatria tornaram Jung um dos grandes expert em sonhos de nosso tempo. Desse vastíssimo material sobre o assunto pode-se sublinhar alguns conceitos de inestimável valor para o conhecimento da psique humana.
Um sonho é um produto psíquico originário do estado de sono e sem motivação consciente. Em um sonho a consciência não está completamente extinta, há sempre um pequeno fragmento atuante. Na maioria dos sonhos, por exemplo, ainda há a consciência do ego, embora seja um ego muito limitado e distorcido, curiosamente conhecido como o ego onírico. É um mero fragmento ou sombra do ego vigil consciente (CW 8 - P305).
Como acontece no estado de vigília, onde as pessoas reais e as coisas entram em nosso campo de visão, no sonho as imagens são inseridas em outro tipo de realidade que faz parte do campo da consciência do ego onírico. Não nos sentimos como se estivéssemos produzindo conscientemente sonhos, pois eles, além de não estarem sujeitos ao nosso controle, obedecem às suas próprias leis. Os sonhos são, obviamente, complexos psíquicos autônomos que se formam por conta própria e de seu próprio material. Por outro lado, a origem das motivações dos sonhos não é de nosso conhecimento consciente e pode-se dizer que os sonhos vêm diretamente do inconsciente (CW 8 - P305).
A existência de fantasias inconscientemente e não realizadas aumenta a freqüência e a intensidade dos sonhos. Quando essas fantasias se tornam conscientes os sonhos mudam seu caráter e se tornam menos intensos e menos freqüentes. A partir disso podemos concluir que os sonhos muitas vezes contêm fantasias que "desejam" se tornarem conscientes.
Sonhos não enganam, não distorcem, não mentem e nem disfarçam; eles sempre procuram expressar algo que o Ego não compreentende ou nem sabe. Um sonho é um auto-retrato espontâneo e de forma simbólica da realidade e da situação do inconsciente.
Assim como o corpo reage fisiologiamente às agressões, ferimentos, infecções ou qualquer outra condição anormal, as funções psíquicas também reagem à perturbações emocionais perigosas com mecanismos de defesa intencional. Entre as reações defensivas propositais (compensatórias) do inconsciente incluímos os sonhos (CW 8 - P253).
Durante a Primeira Guerra Mundial os soldados sonhavam muito menos com a guerra quando estavam no campo de combate do que quando estavam em suas casas. Os psiquiatras militares consideravam fundamental retirar o soldado das linhas de frente quando ele começava a sonhar muito com as cenas de guerra; - isso significava que o soldado já não possuía defesas psíquicas eficientes contra as solicitações (vivenciais) de fora. (CW 8 - P303)
Assim como a atividade psíquica consciente pode criar mecanismos defensivos, inconscientemente nossa atividade psíquica produz sonhos, fantasias, etc. Um sonho que se nos apresenta não é criado conscientemente, apesar de termos consciência de sua percepção e mesmo reprodução. O sonho continua sendo uma fonte de atividade criativa inconsciente (CW 6 - p485).
 "... O inconsciente tem uma função compensatória à consciência, mas especularmos o que o inconsciente é em si, pode ser uma atitude estéril ... Por sua própria natureza, a compreensão do inconsciente vai além de toda nossa cognição e o que conseguimos, apenas, é ter acesso aos produtos do inconsciente, tais como os sonhos e fantasias, mas não temos acesso ao inconsciente em si. Um fato cientificamente comprovado é que os sonhos, por exemplo, quase sempre têm um conteúdo que pode aliviar e corrigir a atitude da consciência. Por isso falamos da função compensatória do inconsciente " (CW 6 - P520).
Para Jung, os instintos e os arquétipos formam o chamado inconsciente coletivo. Coletivo porque, ao contrário do inconsciente pessoal, este tipo de inconsciente não tem características únicas e individuais, mas ocorrência universal, regular e coletiva. Tal como acontece com os instintos, o inconsciente coletivo é um fenômeno comum a toda a humanidade para Jung . Ele defende a idéia de que as imagens do inconsciente coletivo e os arquétipos são a origem e composição dos "grandes sonhos".
Jung atribui aos arquétipos as mesmas qualidades fisiológicas dos instintos, portanto, são fenômenos comuns à toda humanidade. Tal aspecto universal explicaria, para Jung, ter encontrado as mesmas similaridades mitológicas (arquetípicas) nos sonhos de seus pacientes em Basileia, na Suíça, e os aborígines na Austrália. Encontrou ainda as mesmas semelhanças dos sonhos entre os afro-americanos e os europeus arianos, e da mesma forma entre os loucos e os não loucos.
É importante ressaltar que, do ponto de vista junguiano, existem cinco grupos principais de fatores instintivos, a fome, a sexualidade, a criatividade, a atividade e a reflexão, sendo esta última de natureza cultural por excelência (P CW8 114). Jung, ao contrário do filósofo inglês John Locke(1), acreditava que "o homem não nasce como uma tábula rasa", mas com um cérebro que é o resultado do desenvolvimento de uma longa sucessão e cadeia de antepassados  (CW 8 p 372).
 (1) - O filósofo inglês John Locke (1632-1704), considerado o protagonista do empirismo, detalhou a teoria da Tabula Rasa em seu livro, Ensaio acerca do Entendimento Humano (1690). Para Locke, todas as pessoas nascem sem saber de absolutamente nada, sem impressões alguma, sem conhecimento algum. Então todo o processo do conhecer, do saber e do agir é aprendido pela experiência, depois do nascimento pela tentativa e erro (i.e. o homem nasce como se fosse uma "folha em branco"). Contra esse argumento Jung faz uma comparação: seria como se os passaros, ao nascerem, precisassem cada um aprender por si a tecer seu ninho. 
Segundo Jung, "se o inconsciente coletivo não existisse, tudo poderia ser alcançado através da educação; esta poderia reduzir um ser humano a uma máquina psíquica com a impunidade, ou transformá-lo em um ideal" (CW8 P373). Em última análise, oinconsciente coletivo seria um depositário do mundo, da existência humana, estaria inserido na estrutura do cérebro e do sistema nervoso simpático (CW8 P373).
A Unidade “SELF e ALMA”Por "self" entendemos um conceito empírico, ou seja, “toda a gama de fenômenos psíquicos no ser humano. Ela expressa a unidade da personalidade como um todo” (CW vol. 6, p 460). Por "alma" entendemos “um complexo funcional definido que pode ser mais bem descrito como uma personalidade” (CW vol. 6, p 463). Para Jung, a unidade do Self e Soul representa a razão da nossa própria existência. Esta unidade, ou personalidade, tem características únicas em cada um de nós. Por causa dessa particularidade o nosso inconsciente não age apenas de forma instintiva e coletiva, mas, sobretudo, de forma subjetiva e pessoal.
A descrição de Ego para Jung 
Mesmo se o Ego ocupasse o centro da psique, ele não representaria a totalidade do Self. O ego pode ser mais bem descrito como um complexo psíquico com a mesma natureza da consciência. Daí Jung ter falado em "ego-complexo", que seria apenas mais um complexo psíquico entre outros.
O Ego é um complexo que não compreende o ser humano total, uma função que esquece infinitamente mais do que sabe. Não obstante, o Ego tem visto e ouvido infinitamente, mas nunca se tornou plenamente consciente. Há pensamentos completamente formados que surgem fora do alcance da consciência e dos quais o Ego nada sabe. O Ego tem uma vaga noção da incrível e importante função reguladora do sistema nervoso simpático em relação ao processo de equilíbrio interno do corpo. O Ego talvez compreenda uma parte menor do que uma consciência plena teria de compreender (CW Vol.8 p 324).
É evidente que o modelo da psique de Jung não foi baseada apenas no Ego, ou no ego- complexo, mas sobretudo, também em outros complexos. Se tomarmos o diagrama abaixo como base de entendimento da psique humana, percebemos o Ego como parte consciente e parte inconsciente. A mesma localização dupla se aplica para a sensaçãoe para a intuição.
sentimento, por sua vez, se instala bem no fundo do inconsciente, enquanto opensamento está totalmente consciente. Tal diagrama (figura) gerou inúmeras e acaloradas discussões no mundo psicanalítico ao longo do tempo, muito embora tenha contribuído didaticamente para o estudo e compreensão do assunto complexo como a psique.

Jung 2

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